Como o espiritismo explica reencarnar e não se lembrar de vidas passadas

 


" A questão da pluralidade das existências há muito tempo preocupa os filósofos, e mais de um viu, na anterioridade da alma, a única solução possível dos problemas mais importantes da psicologia; sem esse princípio, encontraram-se parados a cada passo e acolhidos num impasse de onde não puderam sair senão com a ajuda da pluralidade das existências.

A existência espiritual da alma, nos diz o espiritismo, é sua existência normal, com lembrança retrospectiva indefinida; as existências corpóreas não são senão intervalos, curtas estações na existência espiritual, e a soma de todas essas estações não é senão uma parte mínima da existência normal, absolutamente como se, numa viagem de vários anos, se parasse de tempos em tempos durante algumas horas.

Se, durante as existências corpóreas, parece nela haver solução de continuidade pela ausência de lembrança, a ligação se estabelece durante a vida espiritual, que não tem interrupção; a solução de continuidade não existe, em realidade, senão para a vida corpórea exterior e de relação; e aqui a ausência de lembrança prova a sabedoria da Providência que não quis que o homem (a humanidade) fosse muito desviada da vida real, onde tem deveres a cumprir; mas, no estado de repouso do corpo, no sono, a alma retoma em parte o seu vôo, e aí se restabelece a cadeia interrompida somente durante a vigília.

A isso se pode ainda fazer uma objeção e perguntar que proveito se pode tirar de suas existências anteriores para a sua melhoria, se não se lembra das faltas que se cometeu. O espiritismo responde primeiro que a lembrança de existências infelizes, juntando-se as misérias da vida presente, tornaria esta ainda mais penosa; é, pois, um acréscimo de sofrimentos que Deus quis nos poupar; sem isso, frequentemente, quanto não seria nossa humilhação pensando no que fomos!

Quanto ao nosso adiantamento, essa lembrança é inútil. Durante cada existência, damos alguns passos adiante; adquirimos algumas qualidades e nos despojamos de algumas imperfeições; cada uma delas é, assim, um novo ponto de partida, em que somos o que nos houvermos feito, em que nos tomamos por aquilo que somos, sem ter que nos inquietarmos com aquilo que fomos.

Se, numa existência anterior, fomos antropófagos, o que isso nos faz se não o somos mais? Se tivemos um defeito qualquer do qual não resta mais os traços, é uma cota liquidada, com a qual não temos nada a nos preocupar."

Livro Obras Póstumas, Allan Kardec, p. 184

(Esse livro tem algumas merdas afirmadas pelo próprio Kardec sobre raça, cor, beleza, mas, considerando que essas merdas eram a mentalidade dos anos 1800 e atualmente são alvo do apurado senso crítico de nosso tempo, não desvirtuam o conteúdo total do livro).

KARDEC, Alan. Obras Póstumas. 3ª ed.IDE Editora, Araras-SP, 1995.

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