Pimenta nos olhos dos outros é colírio

Espírito Lidiane: Há um ditado popular muito propalado pelo país, com variantes pequenas, que se configura mais ou menos nestes termos: “Pimenta nos olhos dos outros é colírio”. Um princípio psicológico acertadíssimo. A dor alheia costuma ser menoscabada, na mesma medida em que a própria é supervalorizada, por efeito da parcialidade inerente às funções do ego, sempre inclinado a se autopromover e a subestimar o valor do outro.

Assim, é comum que homens julguem não haver tanto machismo, como as mulheres o afirmam. O mesmo sentem brancos, em relação a negros que postulam por seus direitos, numa sociedade que visivelmente desfavorece, praticamente em todos os sentidos, os portadores de maior concentração de melanina na pele.

Na modernidade, embora mais timidamente, em comparação com os dois exemplos típicos do vício do “não é bem assim: você está exagerando, porque tem um problema na área” (pelo óbvio do desacerto da assertiva neste caso), defensores da causa gay são vistos como cultores da hipérbole… até que apareça, a quem assim nos julga, um filho gay em casa, ou que a própria pessoa se veja desenvolvendo (seria mais correto, psicologicamente, dizer-se: descobrindo) tendências homossexuais em si. Logo, então, entram as racionalizações, as fugas e as projeções, para outros temas, do assunto que é, apenas e tão-somente: homofobia, pura e crua, abjeta e “descarada”.

Na trilha desta luta por criar uma realidade paralela que justifique o injustificável, o filho de 17 anos, envolvendo-se em namoro com um colega de 20, é tido como “menor abusado” – o que jamais se diria se o par se formasse por sexos opostos, ainda que a diferença de idade entre ambos fosse o dobro ou o triplo da aqui considerada.

Igualmente acontece com pessoas de destaque social ou proeminência de qualquer ordem, como professores, empresários abastados, homens públicos e psicólogos, que são apontados como “sedutores e aproveitadores de mentes mais influenciáveis ou de gente necessitada e fragilizada”, nesta mesma rota de argumentação hipócrita, quando se trata de homossexuais.

Se a figura pública ou “de poder” se envolvesse com indivíduo do sexo oposto, a “vítima” seria imediatamente exalçada à categoria de “sortuda”, e os familiares “do(a) pobre coitado(a)”, que se mostravam revoltados e indignados com o “aliciamento” de seu ente “querido”, estariam orgulhosos e felizes de terem uma personalidade de destaque sendo agregada à família, por meio da relação HETEROSSEXUAL.

A mentira que se prega a si mesmo é a pior de todas. É disso que padece a maior parte dos homófobos da atualidade. Poucos são os que assumem abertamente sua ignorância e atraso, porque é exatamente isso que revela quem, com transparência e honestidade, em meios medianamente esclarecidos, condena a homossexualidade. Enquanto isso, os disfarces mal-ajambrados da homofobia continuam sendo utilizados, como se fosse possível esconder de qualquer criatura relativamente informada, hoje, algo tão óbvio como a homofobia. Lidiane (AGUIAR; LIDIANE, 2009).
Referência

AGUIAR, Benjamim Teixeira de. LIDIANE, Espírito. Defesa ou Panegírico Gay? 2009. Disponível em<http://www.saltoquantico.com.br/2009/09/15/defesa-ou-panegirico-gay/> Acesso em abr. 2017

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